Cobertor Azul

terça-feira, junho 28, 2005

O cobertor azul

O pastor mais assustado naquela noite era o pequeno Ladius, de apenas dez anos. Escondeu-se atrás de seus três irmãos mais velhos quando uma estrela muito brilhante iluminou a colina. E quando um anjo apareceu, escondeu-se atrás de uma rocha enorme.

Entretanto, depois que Ladius ouviu a alegre notícia, o medo lhe deixou, e ele avançou até seus irmãos que estavam planejando ir para Belém.

- Quem cuidará dos carneiros? Perguntou Samuel, o mais velho.

Ladius, apoiando-se em sua bengala para suportar o pé aleijado, ofereceu-se,
- Eu iria atrasar sua caminhada. Deixe-me ficar com os carneiros.

Os irmãos protestaram no início mas acabaram por concordar.

- Cada um de nós deve levar um presente. Disse Samuel.

Um dos irmãos escolheu a pedra que usava para acender fogo para a criança. Outro escolheu lírios do campo para fazer uma guirlanda para o rei. Samuel decidiu por sua posse mais preciosa - seu anel do ouro.

- Levem. Dê-lhe meu cobertor. Disse Ladius. Um desgastado e remendado cobertor.
- Não, Ladius. Respondeu Samuel. O cobertor está esfarrapado demais até para dar a um mendigo - imagine para um rei. Além disso, você vai precisar dele nesta noite.

Os irmãos partiram, deixando Ladius sozinho com o fogo. Colocou sua cabeça em cima do cobertor e enterrou o rosto em suas mãos.

- Você vem, Ladius. - Chamou uma voz. Em pé estava o mesmo anjo que havia trazido a notícia - Você quer ver a criança, não é?
- Sim. - Ladius assentiu. - Mas devo ficar aqui.
- Meu nome é Gabriel. - Disse o anjo - Seus carneiros estarão seguros. Pegue minha mão e traga seu cobertor. A criança pode precisar dele.

De repente, Ladius estava do lado de fora de um estábulo. Ajoelhou-se próximo à uma manjedoura onde estavam seus irmãos. Ladius começou a chama-los, mas o anjo pediu silêncio levando um dedo aos lábios.
- Dê-me o cobertor - sussurrou Gabriel.

O anjo pegou e cobriu suavemente o bebê. Mas o cobertor não estava mais tão desgastado. Agora cintilava como o orvalho no brilho da luz de um novo dia. Retornando, Gabriel apertou a mão de Ladius:
- Seu presente foi o melhor de todos, porque você deu, com amor, tudo o que você tinha.

- Acorda, Ladius, acorda!

O menino esfregou os olhos e tentou protegê-los do sol. Sobre ele estava Samuel.
- Vocês o encontraram? Perguntou Ladius.
- Sim. - respondeu Samuel - Mas diga-me por que você estava dormindo sem seu cobertor?

Ladius olhou em volta, maravilhado. O cobertor azul, remendado e desgastado, não pode ser encontrado em nenhum lugar.


Fred Bauer

quarta-feira, junho 15, 2005

Poema do homem-rã

Sou feliz por ter nascido
no tempo dos homens-rãs
que descem ao mar perdido
na doçura das manhãs.
Mergulham, imponderáveis,
por entre as águas tranquilas,
enquanto singram, em filas,
peixinhos de cores amáveis.
Vão e vêm, serpenteiam,
em compassos de ballet.
Seus lentos gestos penteiam
madeixas que ninguém vê.

Com barbatanas calçadas
e pulmões a tiracolo,
roçam-se os homens no solo
sob um céu de águas paradas.

Sob o luminoso feixe
correm de um lado para outro,
montam no lombo de um peixe
como no dorso de um potro.

Onde as sereias de espuma?
Tritões escorrendo babugem?
E os monstros cor de ferrugem
rolando trovões na bruma?

Eu sou o homem. O Homem.
Desço ao mar e subo ao céu.
Não há temores que me domem
É tudo meu, tudo meu.

António Gedeão

quinta-feira, junho 09, 2005

Ser Poeta

Ser poeta é ser mais alto, é ser maior
Do que os homens! Morder como quem beija!
É ser mendigo e dar como quem seja
Rei do Reino de Aquém e de Além Dor!

É ter de mil desejos o esplendos
E não saber sequer que se deseja!
É ter cá dentro um astro que flameja,
É ter garras e asas de condor!

É ter fome, é ter sede de Infinito!
Por elmo, as manhãs de oiro e cetim?
É condensar o mundo num só grito!

E é amar-te, assim, perdidamente?
É seres alma e sangue e vida em mim
E dizê-lo cantando a toda a gente!


(Florbela Espanca, «Charneca em Flor», in «Poesia Completa»

sábado, junho 04, 2005

...

Quem sabe, não quer
Quem quer, não pode
Quem pode, não sabe
...E assim vai o mundo!

quarta-feira, junho 01, 2005

Quadras ao Gosto Popular

Dias são dias, e noites
São noites e não dormi...
Os dias a não te ver
As noites pensando em ti.


Fernando Pessoa